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Enquanto o mundo aposta na combinação entre fontes renováveis e firmes, o Brasil insiste em subsídios e utopias

Articulistas afirmam que a MP 1.307 é um erro estratégico que pode nos tirar do mapa dos investimentos na indústria 4.0 impulsionada por data centers

“É você que ama o passado e não vê que o novo sempre vem”

–Belchior

A indústria 4.0 transformou os dados no novo petróleo. Empresas, países e a sociedade, por meio da obtenção, da análise, da armazenagem e do processamento desses dados acharam uma forma de conhecer melhor os seus clientes, entender e antecipar tendências, começar e terminar uma guerra. Mas toda essa informação virtual precisa ser armazenada no mundo real. Os data centers se tornaram a bola da vez para o funcionamento dessa nova ordem econômica.

Para além da estrutura física desse grande “cofre” de informações, toda vez que interagimos com uma inteligência artificial, ela aciona servidores, processa dados e consome muita energia. Hoje, os data centers já são responsáveis por 1,5% de todo o consumo de energia do planeta e segundo a Agência Internacional de Energia podem chegar a 3% em 2030. 

Produzir toda essa energia para o funcionamento e crescimento dessa tecnologia é um desafio não só para o Brasil, mas para todos os países do mundo. A corrida para a atração desses investimentos está só começando e os vencedores vão ser aqueles que conseguirem endereçar as dificuldades e apresentar soluções. 

O Brasil tem uma enorme vantagem comparativa. Temos uma enorme diversidade energética e nossa capacidade de produção de energia renovável é um grande diferencial. Porém, esse diferencial não pode ser entendido como um salvo conduto, que nos faça ignorar outras variáveis importantes para que big techs e operadores de data centers invistam no Brasil. 

O uso da geração renovável é um diferencial importante, mas não é o único. A intermitência das fontes renováveis é um problema maior. Os dados não escolhem o horário do sol ou do vento para serem criados e processados. Por esse motivo, não existe um único data center no mundo funcionando 100% a geração renovável, e a solução para a intermitência vem obrigatoriamente de uma fonte de energia firme, ou no jargão do setor elétrico, energias despacháveis. 

Nos Estados Unidos, líder mundial na indústria de data center, duas soluções vêm sendo adotadas. A 1ª são as térmicas a gás natural, escolha feita pelo Projeto Stargate, maior data center do mundo, localizado no Texas, que além da geração eólica, incorporou ao projeto uma termelétrica a gás natural. A 2ª é o retorno dos investimentos na geração nuclear. Hoje, os SMR (Small Modular Reactors), pequenos reatores nucleares, são uma realidade. 

A tendência mundial para resolver o problema da intermitência da geração renovável conectado às unidades consumidoras brutais de energia é instalar os data centers onde existe diversidade de oferta de energia entre as despacháveis e as não despacháveis. E no Brasil não podemos pensar diferente. 

É ilusão achar que a fonte firme de energia para os data centers venha do hidrogênio verde ou de baterias enquanto o mundo todo vai na direção contrária e de maior eficiência da geração nuclear ou do gás natural. O mundo nesse momento de transição energética adotou o conceito de energy addition na corrida pelos investimentos, e nos data centers não pode ser diferente. O Brasil tem todas as características para se tornar um lugar atrativo para essa indústria, mas precisa ter um olhar pragmático e realista para atrair esses investimentos. Essa corrida é global. Nossos concorrentes já estão liderando esses investimentos. Corremos o risco de virar uma jabuticaba, tocando o samba de uma nota só com a bandeira das renováveis como a única solução.

Em vez de apresentar soluções do passado como a recente MP 1.307 publicada em 18 de julho, insistindo em subsídios para as energias renováveis, reserva de mercado e um olhar ideológico da questão energética, o país deveria incentivar, a instalação de data centers onde geograficamente se possa combinar o potencial renovável com uma fonte despachável de energia. Esse é o caso da região Norte do país, onde temos grandes reservas de gás natural e, em particular, dos Estados de Amazonas, Maranhão, Amapá, Pará e Sergipe. Ainda mais agora com o que virá de nova produção com a Margem Equatorial. 

A MP 1.307 vai na contramão do mundo. Estados que tinham vantagens comparativas para se tornarem atrativos nos investimentos dos data centers passaram de mocinhos a vilões. A MP cria um incentivo artificial para resolver o teorema do impossível, um data center com geração 100% renovável. O resultado será a fuga de investimentos e mais uma vez vamos ficar para trás. O problema é que a MP tem duração de 120 dias e nesse prazo poderá se fazer coisas que deixarão sequelas no mercado de energia, mesmo se a MP caducar. 

O mundo caminha para um aumento no consumo de energia liderado pela indústria 4.0, que demanda energia 24 horas por dia, 7 dias por semana e 365 dias no ano. Apesar de todo o investimento nas fontes renováveis, a expansão da inteligência artificial está superando o crescimento da oferta de energia no planeta. A penetração dessas novas tecnologias na sociedade vai depender cada vez mais de energia segura, abundante e confiável e não de subsídios para as energias renováveis mais uma vez pagos pelo consumidor. 

Publicado originalmente pelo Poder360.