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Firulas nas narrativas não vão trazer resultados para um mercado de gás natural mais racional e competitivo

Em linhas gerais, o Brasil tem um bom diagnóstico sobre o que fazer para ampliar a competitividade do gás natural – insumo essencial para o processo de reindustrialização, segurança energética e transição energética do País.

Há gargalos que hoje roubam a competitividade nas etapas de escoamento e processamento, e no setor de transporte por gasodutos.

Estudos apresentados pela EPE, braço de estudos do MME, mostram que essas etapas já deveriam ter custos muito menores porque os investimentos nessas infraestruturas foram amortizados faz tempo.

A imensa concentração no mercado nacional, em que a Petrobras detém pelo menos 70% da oferta, é outro fator que veda a criação de um ambiente realmente competitivo. Por isso, a importância de usar a PPSA como fornecedora de gás por meio de leilões.

Existem soluções que vêm de experiências bem-sucedidas, em países como Reino Unido e Espanha, que adotaram o Gas Release, programa que obriga agentes dominantes a leiloar compulsoriamente parte das suas reservas para companhias menores. Isso também já foi objeto de estudo da EPE, com apresentação este ano no auditório do MME. Porém, a tentativa de colocar em prática esse tipo de leilão não foi exitosa, tendo sempre a oposição da Petrobras.

A raiz dos problemas e as possíveis soluções, portanto, estão bem mapeadas. O que o mercado espera, agora, são ações assertivas. É o contrário do que faz segmentos do governo.

Jogando para a torcida em ano pré-eleitoral, alguns deles valeram-se de um anúncio de rotina – a variação trimestral no preço da molécula – para vender a ideia de que a redução de 14% (efetivada pela Petrobras por contrato, seguindo a variação de indicadores como Brent e dólar) deveria, automaticamente, ter porcentual idêntico para o consumidor final.

Não é preciso ser um especialista para saber que a molécula de gás natural representa uma parcela da tarifa para o consumidor, de cerca de 50%, a depender do contrato da Petrobras com as distribuidoras, e que o porcentual restante é composto pela tarifa de transporte por gasodutos, pela margem das concessionárias de distribuição de gás canalizado e impostos.

Embora ainda domine algo como 80% da comercialização, a Petrobras não mais é a única fonte de fornecimento – algumas concessionárias mantêm contratos com outros supridores, ou seja, variações no preço da molécula da Petrobras são refletidas na proporção de seu volume na matriz de suprimento da distribuidora.

Por fim, cada contrato de concessão estadual tem sua especificidade, fator que impede um porcentual de reajuste unificado. E as distribuidoras são pass-through. Não obtêm qualquer ganho sobre a molécula. Cumprem a tabela tarifária calculada pelas respectivas agências reguladoras estaduais.

A hora é de mais ação do que falação. Firulas nas narrativas, definitivamente, não vão trazer os resultados que o País precisa para um mercado de gás mais racional e competitivo.

Publicado originalmente pelo Estadão.