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Cotação do barril da commodity do tipo WTI bate 20 dólares; presidente dos EUA, Donald Trump, deve interferir para evitar mais desvalorização no curto prazo

Por Felipe Mendes e Victor Irajá para Veja.

A cotação do petróleo tem sido dissolvida nos últimos meses. Com a disseminação do novo coronavírus (Covid-19) pelo mundo e a guerra fria protagonizada por países como Arábia Saudita e Rússia, o preço do barril do tipo WTI, que é retirado de poços no Texas (EUA), chegou a ser cotado abaixo de 20 dólares nesta segunda-feira, 30. No início deste ano, o valor do combustível fóssil estava em torno de 60 dólares. A desvalorização para o período é de estarrecedores 65%. Mas não é só isso. O petróleo do tipo Brent, utilizado como referência pela Petrobras e pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), registra uma cotação momentânea de cerca de 25 dólares, o que significa uma queda de 60% em relação ao valor da commodity negociado em janeiro. Os valores estão no menor nível desde 2002, quando o mundo voltava às atenções aos impactos da guerra protagonizada por George W. Bush, ex-presidente americano, no Oriente Médio.

Tudo indica que os patamares da commodity acima dos 50 dólares ao barril dificilmente voltarão a ser vistos em um curto espaço de tempo. Com diversos países literalmente fechados, as companhias aéreas estão deixando de consumir querosene. Com a queda da demanda, por causa da desaceleração de diversas economias, há um receio de que a guerra por preços entre os países produtores derrube ainda mais o patamar do combustível, já que as principais companhias do setor pretendem aumentar suas produções e, com isso, deixar o mercado com petróleo em demasia.

“Os voos de longa distância, que são os que mais consomem combustíveis, diminuíram cerca de 80% pelo mundo com o fechamento das fronteiras. Hoje a situação é de preços baixos com demanda em queda vertiginosa. Para uma empresa como a Petrobras, isso é uma tragédia”, diz David Zylbersztajn, professor da PUC Rio e ex-diretor da agência reguladora ANP. O cenário hoje é de tempestade perfeita. A tendência do mercado hoje não é de uma estabilização no valor da commodity. “A desaceleração do refino de petróleo se acelerará à medida em que o bloqueio global se intensificar e o coronavírus continuar a se espalhar. As preocupações com excesso de oferta permanecem elevadas”, diz Edward Moya, analista de mercado da Oanda, em relatório.

O catalisador dessa tempestade que devasta o preço do petróleo mundo afora é a Saudi Aramco. A companhia petrolífera da Arábia Saudita, um dos símbolos do país, passara por um processo de abertura de capital em dezembro de 2019, quando captou nada menos que 25,6 bilhões de dólares. Hoje, no entanto, vê seu valor de mercado derreter. Diante da crise, anunciou que irá expandir a produção, que hoje é de pouco menos de 10 milhões de barris por dia, para mais de 12 milhões de barris, além de reduzir o preço oficial de venda do barril para algo entre 6 dólares e 8 dólares. A tendência é que os novos patamares entrem em vigor em meados de maio. A principal briga é com a Rússia, que deu o troco na mesma moeda. O país europeu disse estar pronto para suportar a guerra de preços do petróleo por até uma década – a Rússia dispõe de um fundo soberano com 170 bilhões de dólares acumulados graças aos ganhos de petróleo dos últimos anos, o que lhe dá fôlego para superar o período de crise global. Mas isso têm colocado pressão em outros mercados, impactando, sobretudo, o plano de desestatização da Petrobras.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deverá se reunir – ainda que por telefone – nos próximos dias com Vladimir Putin, o mandatário russo, acerca do tema. É um jogo de xadrez no qual Trump tem jogado parado, observando atentamente os movimentos dos inimigos. A guerra, da qual ele tem preferido se abster, acaba afetando os produtores americanos. Em coletiva recente, o presidente americano disse que irá agir “no momento apropriado”. “Temos muito poder sobre a situação e estamos tentando encontrar um meio termo de alguma forma”, disse. Segundo ele, o que acontece hoje é inviável tanto para os russos, que já praticam o menor preço em décadas para o barril de petróleo, quanto para os sauditas. O intuito de Trump ao, enfim, intervir na situação e jogar água em cima do ímpeto russo é salvar a indústria de gás de xisto (não convencional) do país, que precisa do barril de petróleo WTI cotado próximo aos 40 dólares para se manter atrativa.

Impactos

Estima-se que o impasse no preço do barril de petróleo no mundo ainda deixe de gerar algo em torno de 8 bilhões de reais em arrecadação para o estado do Rio de Janeiro. Em 2019, com o petróleo a 60 dólares, o Rio amealhou 14 bilhões de reais em royalties. A alta do dólar frente ao real, no entanto, reduz as perdas, mas não as eliminam. “O Rio tem uma dependência extremamente elevada do valor do petróleo. A combinação da queda do preço com a queda de produção seguramente vai ter um impacto monstruoso nas finanças do estado”, diz Zylbersztajn. “É um preço que o estado paga por não diversificar sua matriz de receita”.

Já para a Petrobras, a guerra é um banho de água fria sobre as pretensões do governo de avançar com seu plano de desestatização. Com ativos desvalorizados, o programa é posto em dúvida. A necessidade de controle de caixa – investimentos e renegociação de dívidas –, coloca a empresa entre a cruz e a espada. Até mesmo o ensejo da troca do combustível fóssil por fontes renováveis será impactado com o valor do barril ao chão. “Com a desavença entre a Arábia Saudita e a Rússia, os produtores estão aproveitando a redução global da demanda por petróleo para atacar os americanos e produtores de biocombustível, como o Brasil”, diz Adriano Pires, sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

(Fonte: Veja)