Adoção de veículos elétricos é improvável sem incentivo governamental, diz Adriano Pires
A compra é uma tendência global
Preço de entrada no Brasil é elevado
Veículo ainda não é regulamentado
Fatores dificultam adoção em curto prazo
Veículos Elétricos no Brasil
Os veículos elétricos e híbridos são quase 0,05% da frota existente no Brasil. No ano passado representaram 0,2% das vendas totais cerca de 4 mil veículos. A adoção de veículos elétricos é uma tendência global no contexto da transição para fontes de energia menos poluentes, devido à preocupação com o impacto ambiental de combustíveis fósseis no setor de transportes. No curto prazo, a adoção extensa é improvável devido a barreiras econômicas como elevado preço de entrada e falta de espaço para incentivos governamentais. Certas barreiras podem ser reduzidas com o tempo, principalmente, para veículos híbridos.
Em 2019, os veículos elétricos ainda são itens de luxo, não representando ameaça para as vendas de carros tradicionais de motores de combustão interna no Brasil. O preço de entrada deste tipo de veículo é mais que o dobro do preço do carro médio no país, e, além disso, a população tem uma renda média baixa comparada a países onde os elétricos estão sendo adotados em larga escala. Para comparação, o preço para um carro elétrico de entrada no Brasil custa quase 4 vezes a renda per capita média enquanto nos Estados Unidos o equivalente representa apenas 40% da renda per capita daquele país.
Mesmo em países desenvolvidos como a Noruega, a adoção de elétricos em massa depende de incentivos importantes do governo, o que ainda não ocorre no Brasil. Os incentivos em vigor no Brasil, já contabilizados no preço de veículos elétricos, são menor IPI e Imposto de Importação. Novos incentivos poderiam partir dos governos estaduais, tais como menor IPVA e ICMS, mas considerando a situação fiscal nos Estados, são considerados de menor prioridade comparados a investimentos em saúde e educação, para dar dois exemplos. O mesmo ocorre a nível federal, dada a conjuntura de ajuste fiscal e redução de gastos públicos.
Como atrativos para o consumidor há seu apelo ambiental, manutenção barata e menor custo de combustível. A maior penetração depende de um declínio nos preços dos veículos e solução para o baixo valor de revenda, dependente dos custos da bateria e sua vida útil comparativamente curta. Se a tecnologia das baterias avançar, reduzindo custos e prolongando a vida útil, seria natural observar uma demanda adicional significativa. Em parte, a regulação da poluição nas cidades e seu impacto na saúde pública dita o ritmo de adoção de novas tecnologias pelos fabricantes de automóveis.
Comparada a outras modalidades de demanda de eletricidade, o uso crescente de veículos elétricos no país não deve levar a maior necessidades de capacidade de geração e transmissão. O Brasil ainda não possui regulamentação específica para veículos elétricos, apenas algumas diretrizes para os postos de recarga e há dúvidas sobre como sua adoção afetaria a rede de distribuição. É provável que desencadeie um aumento de investimento nas distribuidoras de eletricidade, principalmente em áreas urbanas. No longo prazo, a introdução de smart grids pode permitir a transmissão de energia da bateria do veículo de volta para a rede.
No contexto da discussão dos veículos elétricos é sempre bom e importante lembrar que o Brasil possui uma frota de veículos movidos a um combustível renovável e limpo que é o etanol. Somos grandes produtores e dominamos toda a cadeia de produção do etanol. Devido à etapa de plantio, o etanol é tão eficiente, em termos de emissão total de CO2, que os elétricos puros, o que reduz o caráter emergencial de uma substituição da frota a curto prazo, além de indicar um caminho para uma solução de longo prazo.
O programa de descarbonização do Brasil, RenovaBio, deve impulsionar o consumo de etanol antes mesmo que os veículos elétricos sejam adotados em massa. A eletrificação de veículos deveria ser vista como complementar ao uso do etanol. Híbridos de etanol são uma boa solução para a matriz de transporte, justificado pela infraestrutura de distribuição já existente e os altos investimentos que seriam necessários para a adoção de veículos elétricos puros.
Adriano Pires
Adriano Pires é sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). Doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris XIII (1987), Mestre em Planejamento Energético pela COPPE/UFRJ (1983) e Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980). Atua há mais de 30 anos na área de energia.