Artigo: O petróleo diante de riscos geopolíticos
Um efeito de curto prazo do atentado será na arrecadação de royalties
Por Adriano Pires para O Globo.
O mercado de petróleo foi abalado por um ataque terrorista de grandes proporções, causando severos danos à principal instalação de processamento de petróleo da estatal Saudi Aramco, na Arábia Saudita. O atentado colocou fora de operação cerca de 5 milhões de barris/dia de produção de petróleo e gás, equivalente a 5% do suprimento global. O efeito imediato no mercado global foi um aumento de mais de 10% nos preços do barril na abertura do mercado no dia seguinte aos ataques, seguido por alta volatilidade nos preços.
Não é o primeiro ataque terrorista à infraestrutura de petróleo no Oriente Médio. Este é um risco presente na região em conflitos como a Guerra do Iraque de 2003, a guerra civil na Síria e a atual guerra civil no Iêmen. Na própria Arábia Saudita, uma instalação de processamento de petróleo foi atacada por carros-bomba em 2006, e no ano seguinte o país descobriu uma célula terrorista com explosivos e planos para novos ataques. O que chocou a indústria global no recente ataque foi a escala sem precedentes dos danos e o método utilizado, com drones coordenados.
Operacionalmente, a velocidade de recuperação até a normalização das operações paralisadas vai determinar a pressão de alta nos preços do petróleo e derivados. O mais importante são os efeitos na percepção de riscos geopolíticos sobre a indústria do petróleo, com sauditas e americanos acusando o Irã de participação nos ataques. Ao contrário de outras commodities , como alimentos e minérios, o petróleo está mais ligado a conflitos e atentados terroristas.
O ataque à Saudi Aramco colocou em destaque a tecnologia dos drones para uso militar. Ao mesmo tempo, demonstrou a fragilidade das instalações de infraestrutura em regiões de risco. Esta exposição de fragilidade vai trazer a volatilidade dos preços da commodity até que uma solução confiável seja desenvolvida em resposta a este tipo de ameaça. Dos riscos e consequências do incidente, este parece ser o de efeito mais duradouro.
A questão diplomática não deve ser minimizada, com imediato aumento das tensões entre EUA e Arábia Saudita com o Irã. Enquanto houver possibilidade de agravamento do nível de conflitos, a volatilidade do preço do petróleo cresce, com tendência de alta de preços. Na melhor das hipóteses, haverá um lento processo de pacificação enquanto os ânimos se acalmam, sendo a pior das hipóteses a intensificação de agressões até uma nova guerra na região.
Um alívio para a indústria global de petróleo é que este ataque ocorreu em um período de baixo preço do barril, devido à desaceleração da economia mundial. O Brent havia fechado em US$ 60,22 por barril na sexta-feira antes do ataque, muito abaixo do ponto mais alto do ano, US$ 74,57, alcançado em abril. Nos EUA, o WTI havia fechado em US$ 54,85, uma queda de 17% em relação às máximas de abril.
No mercado brasileiro, as consequências seriam positivas para a exploração e desenvolvimento das reservas do pré-sal, localizadas em região de baixo risco geopolítico. As futuras Rodadas de Licitação vão mostrar se essa tese é verdadeira. A disputa entre as petroleiras, os bônus oferecidos, bem como o excedente de óleo, demonstrarão se as empresas colocam esse menor risco geopolítico do pré-sal no momento de ofertar suas propostas. Um efeito positivo de curto prazo será na arrecadação de royalties. Considerando um preço médio do barril a US$ 70, a arrecadação total em 2019 seria de R$ 57 bilhões, um crescimento de 8% em relação ao ano anterior. Para os estados e municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo, o crescimento anual da arrecadação ultrapassaria 20%.
A Petrobras se vê diante de um desafio. Aumentos de combustíveis fósseis sempre causam tensão política, com ameaças de greve de caminhoneiros. A primeira reação da empresa foi esperar para reajustar os preços de combustíveis, o que já prejudica a rentabilidade. Políticas populistas de reajustes defasados ou subsídios de preços são extremamente negativas e uma ameaça ao quadro institucional, trazendo a insegurança regulatória. A Petrobras seria a grande prejudicada, com o comprometimento da execução tanto de seus investimentos quanto do desinvestimento das refinarias. Melhor seria reajustar os preços dos combustíveis em paridade com o mercado internacional, realizar a venda das refinarias e aumentar a competitividade deste segmento.
Adriano Pires é sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).