Brasil ignora etanol e subsidia carro elétrico; “complexo de vira-lata”, diz Adriano Pires

Por Renata Nunes
Durante anos, o Brasil consolidou sua posição como potência em biocombustíveis, especialmente na produção de etanol. No entanto, o atual direcionamento da política energética nacional parece ignorar essa vantagem comparativa ao concentrar esforços e incentivos no estímulo à eletrificação da frota, inclusive com subsídios para carros elétricos chineses. O alerta é de Adriano Pires, sócio fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), durante entrevista ao programa Strike.
Segundo Pires, o país corre o risco de negligenciar uma solução já consolidada e ambientalmente eficiente, como o etanol, em favor de uma tendência global que pode não ser a melhor para a realidade brasileira. “A gente dá subsídio para carro elétrico, enquanto temos o biocombustível, que o Brasil domina, domina a tecnologia e exporta para o mundo“, criticou. Para ele, insistir nessa direção é repetir soluções do passado para desafios do futuro.
Carro elétrico no Brasil: moda ou estratégia? Por que não o Etanol?
A crítica central de Adriano Pires é sobre a falta de planejamento e coerência na formulação das políticas públicas do setor energético. Ao enfatizar que o Brasil não deveria “inventar moda”, o especialista aponta que o país já possui uma base tecnológica e produtiva robusta no setor de biocombustíveis. “A solução do elétrico pode até ser boa para outro país, mas aqui o etanol já é realidade. E temos agora uma revolução com o etanol de milho“, afirmou.
A produção de etanol de milho no Brasil já representa cerca de 20% do total nacional, segundo dados citados por Pires. Esse novo impulso amplia o potencial da matriz energética renovável e fortalece ainda mais a sinergia entre o setor de energia e o agronegócio. “O agro deveria se juntar mais ao setor energético. Essa parceria pode ser decisiva para transformar o Brasil num país mais poderoso economicamente“, destacou.
Por que o Brasil dá subsídio ao carro elétrico e não olho para o Etanol?
Apesar de já contar com uma matriz de transporte relativamente limpa graças aos biocombustíveis, o Brasil segue a tendência de muitos países ricos ao incentivar a eletrificação. Mas, de acordo com Pires, esse movimento é enviesado e parte de uma visão ideológica descolada da realidade local. Ele chama atenção para a Medida Provisória 1307, que pretende criar zonas especiais para instalação de data centers, com a condição de que utilizem exclusivamente energia renovável.
Para ele, isso mostra um desconhecimento técnico. “Não existe data center 100% movido a energia renovável. Isso é o teorema do impossível“, disse. A exigência compromete a atratividade de investimentos e desconsidera que, mesmo com uso de renováveis, é essencial garantir segurança energética com fontes firmes, como térmicas ou nucleares.
Etanol e a transição energética: onde estamos errando?
A proposta de transição energética sustentável não pode ser baseada apenas em modismos. Pires enfatiza que, para além da sustentabilidade, é preciso considerar segurança energética e acessibilidade. E é justamente o etanol, especialmente com o avanço da produção a partir do milho, que oferece esses atributos com uma base já consolidada.
Ignorar esse potencial em nome de soluções estrangeiras pode comprometer a soberania energética brasileira. Em um momento de transformações globais e mudanças no tabuleiro geopolítico, como o retorno de Donald Trump com tarifas protecionistas e o papel central da energia na guerra da Ucrânia, o Brasil deveria investir nas soluções em que já é competitivo.
Quais são os próximos passos para o etanol ganhar protagonismo?
- Reconhecimento político do etanol como vetor estratégico da matriz energética;
- Redirecionamento de subsídios hoje concentrados nos carros elétricos importados;
- Incentivo à produção e distribuição de etanol de milho em novas regiões;
- Fortalecimento da sinergia entre agroenergia e política energética;
- Campanhas de informação sobre as vantagens ambientais e econômicas do etanol.
A crítica de Adriano Pires vai além do campo técnico. Para ele, insistir na eletrificação sem considerar o contexto brasileiro é sinal de um complexo de vira-lata. “A gente quer comprar carro elétrico chinês enquanto é campeão mundial em biocombustível. Isso é irracional“, concluiu. Nesse sentido, o etanol aparece não apenas como um combustível do passado, mas como uma alternativa inteligente para o futuro energético do Brasil.