Como Antecipar as Receitas do Petróleo
Por Adriano Pires, para O Estado de S.Paulo
Desde a descoberta do pré-sal o governo e as empresas estudam alternativas de financiamento competitivas para acelerar investimentos na exploração e desenvolvimento.
Neste contexto, vem sendo discutida a viabilidade da adoção da Reserve Base Lending (sigla RBL em inglês, ou empréstimo lastreado em reservas), modalidade de financiamento amplamente difundida nos Estados Unidos desde 1970 e uma das principais fontes de financiamento da indústria do shale norte-americano que foi responsável por mais de 90% do crescimento da produção de óleo e gás dos Estados Unidos entre 2009 e 2018.
Essa modalidade de financiamento assemelha-se às estruturas existentes de Project Finance (PF) e Asset Base lending (ABL), ou seja, instrumentos de dívidas que são contratados tendo como lastro a geração de caixa de projetos e, no caso da RBL, reservas provadas de companhias de petróleo, em que antecipam-se recursos por intermédio de bancos para serem aplicados majoritariamente no financiamento dos investimentos pré-produção dos campos. Essa alternativa, costuma ter prazo de cinco a sete anos e geralmente é contratada na modalidade bullet, com pagamento do principal somente no vencimento da dívida.
Análogas às estruturas típicas de Project Finance, as RBL possuem cláusulas restritivas (covenants) como um limite de endividamento líquido sobre o EBITDAX menor do que 4.0x e cobertura de juros acima de 1.0x. Dentre as vantagens permite-se que se contrate dívida não onerosa (non-recourse) à companhia subjacente, portanto ampliando-se a capacidade de endividamento de uma companhia por intermédio dessas estruturas. Estruturas de RBL são bastante utilizadas em regime de partilha de produção.
A ANP vem discutindo desde 2016 (Consulta Pública#15) como introduzir essa alternativa de financiamento tendo realizado workshop temático em dezembro de 2017 e publicado minuta de resolução em novembro de 2018 no âmbito da Consulta Pública #28.
A adoção da RBL no Brasil é oportuna por dois motivos: permitir que novos agentes de pequeno e médio porte possam participar da exploração e produção de petróleo e gás e possibilitar ao governo estudar a antecipação de recursos no âmbito de seu esforço fiscal por intermédio da Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA).
Analisando as cinco rodadas no regime de partilha de 2013 até 2018, o governo arrecadou R$31 bi em bônus de assinatura e obteve um ágio médio de 150% no percentual de partilha em comparação com os percentuais mínimos. Se assumíssemos a curva futura de petróleo atual (preços de petróleo tipo Brent entre 65 e 70 dólares), a curva de aprendizado com o Pré-Sal (reduzindo-se o capex por poço pra US$100 milhões), produtividade média de 25 mil barris por dia, um fator de recuperação dos recursos prováveis de 35% e o percentual máximo antecipável para reservas não desenvolvidas em estruturas de RBL de 60%, o governo brasileiro poderia antecipar entre R$65 bilhões e R$100 bilhões utilizando-se uma taxa de desconto de 10%.
Dentre as desvantagens da modalidade de RBL encontra-se o fato de que o montante disponível não é imutável e sendo revisto periodicamente dependendo do comportamento de variáveis como preço de petróleo, curva de produção, custos de extração e produção ou qualquer variável que possa interferir no fluxo de caixa que está sendo considerado como base para o empréstimo. Não obstante as desvantagens – que são inerentes a estruturas de empréstimos lastreadas em ativos e/ou fluxo de caixas futuros – o momento atual é oportuno para que o governo analise essa opção como indutora da possível aceleração de investimentos via fundo social e também como mais uma ferramenta de atração de novos atores. Uma possível aplicação como ferramenta de alcançar a meta de superavit primária também não deveria ser descartada.
O mercado de RBL é bastante maduro globalmente. Desse modo, bancos internacionais possuem ampla experiência na modalidade e inclusive vivenciaram situações de stress quando da queda dos preços de petróleo para US$30 o barril e as consequentes pressões que surgiram de refinanciamento.
Diretor do CBIE