Post

Haverá um mercado potencial para o GNL em caminhões, navios e locomotivas

A discussão a respeito do novo mercado de gás natural merece um aprofundamento sobre o uso do gás no setor de transporte. No Brasil, a participação do gás natural na matriz de transportes é de apenas 2,3%. Hoje, basicamente, o consumo do gás ocorre através do Gás Natural Veicular (GNV) em carros concentrados nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. Porém, com a chegada do gás do pré-sal e do Gás Natural Liquefeito (GNL) a terminais na costa brasileira, passará a existir um mercado potencial para o uso do GNL em caminhões, navios e mesmo locomotivas. Atualmente, esse mercado está em pleno crescimento nos Estados Unidos, Europa e China.

No mercado americano, depois de substituir o carvão em térmicas e a nafta nas petroquímicas, o gás natural através do GNL começa a ter um crescimento significativo no transporte, em particular nos caminhões. Já rodam no mercado americano algo como 175 mil veículos abastecidos em postos de revenda com gás natural. Os Estados Unidos contam com mais de 1.600 postos de abastecimento de GNV e 140 de GNL. Na Europa não é diferente. Foram criados naquele continente os chamados corredores azuis por onde transitam exclusivamente caminhões à GNL. A China não fica atrás, tendo uma frota de cerca de 200 mil caminhões e com expectativa de fechar 2019 com 315 mil. O mundo conta com aproximadamente 23 milhões de veículos abastecidos por gás.

As vantagens do uso do GNL são, basicamente, três. A primeira consiste na melhora das condições ambientais, com o gás substituindo o diesel. Um dos grandes desafios ambientais da atualidade é a redução do consumo de diesel. A segunda é que, devido ao grande crescimento da oferta de gás natural no mundo, o preço vem se reduzindo, tornando o GNL competitivo em relação ao diesel. E, terceiro, é que o comércio internacional de GNL vem crescendo com a construção de inúmeras plantas de liquefação, em particular, no mercado americano e em terminais pelo mundo afora.

E o Brasil, como está posicionado nesse novo modelo transformacional que está ocorrendo através da substituição do diesel pelo GNL? Por enquanto, de forma tímida. Porém, temos um grande potencial tanto pelo lado da demanda como da oferta de termos um crescimento do uso do GNL no setor de transportes. Vamos aos números. O Brasil é, hoje, um dos maiores mercados mundiais de diesel, com um consumo de 152 milhões de litros por dia. Desse total, importamos mais de 20%. Do lado da oferta, temos uma projeção de praticamente dobrar a produção de gás nacional com o pré-sal. Assim, passaríamos da produção bruta de 129 milhões de m por dia, registrada em setembro de 2019, para 253 milhões de m por dia, em 2029, de acordo com o PDE, da EPE.

Além disso, estamos vendo através dos leilões de energia elétrica um crescimento na construção de terminais de GNL ao longo da costa brasileira. Essa produção do pré-sal pode ser em parte liquefeita e com o GNL, que chega através dos terminais, abastecer o mercado de caminhões. Isso sem falar do potencial de biogás no interior do Brasil, que, liquefeito, também poderá ser destinado aos postos de revenda. As vantagens de se estimular o uso do gás natural no Brasil ultrapassam as questões ambientais e promovem a redução das importações de diesel e dos fretes nos caminhões, dado o combustível mais barato. Isso sem falar na autonomia dos motores a GNL, que supera os mil quilômetros.

O que precisa ser feito? Como sempre, é imprescindível uma regulação adequada. Uma regulação que não crie conflitos e confrontamentos entre produtores e distribuidores de gás. Para que, com isso, não se judicializem processos que, ao final do dia, vão criar barreiras ao crescimento desse mercado. E quem paga a conta do atraso é sempre o consumidor. Também seria fundamental a criação de incentivos como os corredores azuis europeus, modelos de financiamento para a compra de caminhões e mesmo por parte dos estados a redução dos IPVAs. Enfim, oportunidades não faltam neste país. Vamos ter serenidade e bom senso para não perder essa oportunidade de modernizar a matriz de transportes no Brasil.

(Fonte: O Globo)

Adriano Pires é sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).