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A década de 1990 no Brasil foi marcada por relevantes reformas, que demandaram intenso trabalho de diagnóstico, planejamento, articulação e execução. A abertura naquela época gerou perspectivas muito promissoras, cenário que contrasta muito com a realidade atual. O País padece de graves problemas decorrentes da forte intervenção do governo na economia e pelo imenso escândalo de corrupção revelado pela Operação Lava Jato. O mais recente alarme veio da paralisação dos caminhoneiros, a crise de maio de 2018.

A combinação de um Estado intervencionista com um baixo nível de governança e uma supervisão falha dei o terreno fértil para essa indesejável mudança de rumo. No caso da crise do transporte de carga, faltou planejamento em pelo menos duas dimensões: a distorção da matriz energética para o setor de transportes e potencial impacto dos preços de combustíveis na economia. O governo deveria ter se preparado, para um eventual cenário de aumento expressivo de preços de combustíveis desde 2016, quando a Petrobras tornou pública a sua nova política de alinhamento com preços internacionais.

Diante do caos gerado pela paralisação dos caminhoneiros, o governo optou pelo tabelamento dos fretes e a criação da conta diesel, o que representou mergulhar no túnel do tempo. Isso gerou um pesado ônus para a sociedade e duro golpe para atração de players privados para atuação em refino. A história recente, mostra q a despeito da Lei de Petróleo e da Lei das SA, o governo exerceu forte influência na política de preços da Petrobras, em especial, no período de 2011 a 2014, gerando prejuízos e um alto de endividamento.

Caso houvesse players privados relevantes no segmento de refino, o controle de preços seria visto como que de regras, algo que causaria um impacto muito negativo ao país e ações nos órgãos de defesa da concorrênci contra tais práticas. A possibilidade de existência de players privados se tornou ainda mais distante face à decisão cautelar proferida pelo Ministro Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, que fez a Petrobras suspender processos de venda de participações nas refinarias do Nordeste e Sul.

Voltando à crise de maio, a solução transitória deveria ter sido a introdução de um gatilho para o reajuste de preços-refinaria da gaso e do diesel, baseado no acúmulo de determinada variação percentua preços (aumento ou redução). Não faz sentido discutir a precificação segmentos de distribuição e revenda, pois atuam em mercados onde concorrência. Como solução definitiva, a criação de um imposto regulatório flexível que abastecesse um Fundo de Estabilização dos Preços permitindo não repassar ao consumidor a volatilidade do preço do petróleo e da taxa de câmbio. Visa garantir a criação desse mecanismo do Fundo, com repartição do risco de preço entre os vários participante mercado, seria criada uma Contribuição sobre Combustíveis (CSC). No caso da gasolina, o imposto flexível é importante para garantir a competitividade do etanol, pois qualquer alteração no preço da gasolina impacta etanol. E por fim, esta proposta vai ao encontro de uma demanda da sociedade, claramente exposta na greve por tributos justos, eficientes e ambientalmente corretos. Importante ressaltar que o imposto flexível existe, funciona muito bem, em lugares onde prevalecem as regras de mercado na formação dos preços, a exemplo países europeus.

A crise de maio de 2018 comprova que falhas na atuação do governo têm potencial para gerar externalidade bastante negativas para a população e setores da economia do País. O Estado brasileiro precisa melhorar a precisa ter um planejamento energético de qualidade de longo prazo, blindado contra mudanças de governo que considere com seriedade temas como, políticas regionais, novas tecnologias, eficiência energética, fonte renováveis e redução da participação de combustíveis fósseis na matriz brasileira. Não podemos virar as cos para questões globais relativas à indústria.

O Estado brasileiro tem atuação relevante em setores-chave da economia, notadamente através da
Petrobras Eletrobras. A qualidade da governança adotada tem destacado papel na criação ou na destruição de valor de uma empresa e as externalidades negativas causadas por falhas em governança podem ser expressivas, com mostra o recente história destas empresas. A evolução institucional no campo da governança corporativa é notória no país com os lançamentos do Código Amec de Stewardship, do Código Brasileiro de Governança Corporativa (CBGC), e da Instrução 586 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – normativo que exige d companhias abertas informe anual sobre aderência ao CBGC. mas ainda cabem alguns questionamentos.

Como as empresas responderão a esses avanços? Vão encará-los como uma oportunidade ímpar de reflexão com transparência e genuína vontade de aprimorar suas práticas, ou como algo burocrático a ser cumprido? Como a aderência aos códigos e às novas exigências serão monitorados e mensurados pelos conselhos de administração e respectivas instituições responsáveis? Os investidores institucionais exercerão o seu dever fiduciário de monitorar as empresas e de incentivá-las a aprimorar a sua governança?

A sociedade civil, por sua vez, precisa se engajar para monitorar a qualidade da governança da União e a eficiência da gestão pública, seja através da participação individual ou através de associações. Precisamos de Estado com boa governança e gestão e que ofereça serviços de qualidade. A sociedade precisa estar cada vez mais consciente, crítica e ciente do seu poder de vocalização, potencializada pelo uso das mídias sociais. Precisamos avançar e outubro e uma boa oportunidade.

Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE)
Ana Siqueira CFA – é especialista em governança corporativa