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Guerra de preços abre nova crise

Incertezas derrubam a economia

Adriano Pires e Pedro Rodrigues para o Poder360.

O mundo virou de cabeça para baixo. Além do coronavírus que vem afetando a economia global e principalmente o dia a dia da nossa sociedade, outro evento movimentou tanto ou mais os mercados financeiros e o mundo. A queda abrupta do preço do barril do petróleo em razão da disputa política entre o presidente Vladimir Putin e o príncipe saudita Mohamed Bin Salman. Mas por que será que isso aconteceu, qual o papel desses países no jogo global do petróleo? Como essa queda de preços pode afetar o Brasil, o mundo e nosso cotidiano?

Aos primeiros sinais do coronavírus, o mundo passou a direcionar todos os olhares para a China. A China hoje é a fábrica do mundo e o principal importador de petróleo. Um país movido a combustíveis fósseis, carvão, petróleo e gás natural. Com a evolução do surto, a preocupação com a economia chinesa se ampliou, bem como os possíveis impactos nos demais países da Ásia, e nos mercados dos demais países do mundo. A epidemia que está causando grande agitação nos mercados acabou contaminando o mercado de petróleo.

O mundo já vinha, desde o ano passado, experimentando uma desaceleração econômica. E a chegada do coronavírus provocou uma queda ainda maior no crescimento econômico mundial. Quando o mundo para de crescer, necessariamente o consumo do petróleo e dos derivados diminui. Menos demanda por petróleo com a mesma oferta, o preço do produto cai!

Vendo essa diminuição de preços se aproximar, a Opep, cartel formado por alguns países exportadores de petróleo (Argélia, Congo, Gabão, Angola, Guiné Equatorial, Irã, Iraque, Kwiait, Líbia, Nigéria, Venezuela, Emirados Árabes Unidos, liderados pela Arábia Saudita) mais a Rússia (grupo conhecido como Opep+), reuniram-se para chegar a um acordo sobre promover um corte na produção de petróleo. Com o corte da oferta, o preço tenderia a se manter em um patamar mais alto.

Os casos mais marcantes de intervenção da Opep no mercado de petróleo na história foram em 1973 e 1979, anos conhecidos pelos 1º e 2º choques do petróleo. Nesses eventos os países-membros da Opep conseguiram através do corte na oferta quadruplicar em 1973 e duplicar em 1979 o preço do barril de petróleo. De lá para cá, o cartel da Opep vem perdendo força e poder. Daí a ideia de criar a Opep+ com a presença da Rússia, que é o 2º maior exportador e o 3º maior produtor de petróleo do mundo.

Mas porque a Opep perdeu importância na determinação de cotas de produção e de preços no mercado de óleo? Existem alguns fatores para isso ter acontecido, mas 2 são os principais. O 1º deles é uma menor importância dos países-membros no volume total da produção mundial de petróleo. Hoje os membros da Opep representam 42% do total da produção mundial, enquanto na década de 1970 esse número chegava a 55%.

O 2º fator é a diferença socioeconômica entre os países-membros. Como a situação social e econômica da Venezuela é diferente da Nigéria, que é diferente da Arábia Saudita, coordenar qualquer ação entre esses países passa a ser uma tarefa cada vez mais complicada. Acertar cotas de produção nesse contexto dispare dos países-membros é uma tarefa quase impossível.

Existem boatos de que depois de acertar cotas, alguns países rompem o acordo por meio da venda no mercado paralelo. A Arábia Saudita, 2ª maior produtora, 1ª exportadora de petróleo e líder do cartel, não conseguiu dessa vez convencer todos os membros para o corte da oferta. E o pior, também dentro da chamada Opep+ entrou em conflito com a Rússia.

A Rússia não aceitou o corte de 1,5 milhão de barris/dia proposto. Os sauditas dobraram a aposta, dando início a uma guerra de preços. Os sauditas entraram na guerra aumentando a produção no limite de 12 milhões de barris/dia e a reação do mercado foi uma queda de 30% do preço do petróleo. O barril chegou a menos de US$ 35, tendo bancos afirmando que poderia chegar aos US$ 20. Isso somado à crise econômica, turbinada pelo coronavírus, enlouqueceu os mercados e promoveu um banho de sangue com quedas nunca antes vista nas diversas bolsas mundiais.

Quais são as consequências e para onde vamos?

O fato é que as consequências ainda são muito incertas. Até o momento, o que se pode ver é uma total desorganização dos mercados financeiros e produtivos alcançando custos tão gigantes e sem precedentes, tornando impossível prever qualquer resultado. Ainda estamos distantes de responder qual será o novo patamar de preço do petróleo e quanto tempo teremos de crise econômica. Sem falar de quando chegará a vacina do coronavírus.

Ou seja, muitas dúvidas e poucas certezas. As duas únicas certezas é que esse clima de histeria e de pânico, somando a falta de lideranças mundiais que acalmem os mercados e a sociedade, está levando à criação do vírus econômico, um vírus com consequências maiores do que o coronavírus. Esse vírus econômico já está promovendo uma crise sem precedentes e que irá causar estragos na economia mundial de maiores proporções, exigindo prazos mais longos de recuperação do que os provocados pelo coronavírus.

A outra certeza é que o petróleo continua sendo a principal fonte de energia do mundo e que o comportamento do seu preço ainda determina para onde caminha a economia. No final do dia, estamos vivendo mais uma crise do petróleo diferente de todas as outras na história. Dessa vez uma superoferta, com queda na demanda.

(Fonte: Poder360)

Adriano Pires é sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

Pedro Rodrigues é sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura e sócio fundador do CBIE Advisory.