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Para especialistas, excesso de leilões contribuiu para encalhe de áreas

Por Bruno Rosa e Ramona Ordoñez para O Globo.

RIO – Após dois leilões do pré-sal sem a presença de petroleiras estrangeiras e com resultados abaixo das expectativas, o governo defendeu uma mudança no regime de exploração para atrair investimentos. Especialistas, porém, avaliam que a pressão por recursos levou o governo a cometer um erro estratégico no calendário de leilões, o que teria contribuído para o encalhe das áreas.

Para Anderson Dutra, da consultoria KPMG, o governo sempre foi a favor de mudanças no regime de exploração, mas sabia que, se iniciasse o debate antes dos dois leilões desta semana, eles não aconteceriam este ano e não haveria arrecadação.

Dutra ressalta que, além dos recursos para o ajuste fiscal, o governo tinha até o fim do ano para pagar a Petrobras a revisão do acordo da cessão onerosa — que permitiu que a estatal explorasse até 5 bilhões de barris no pré-sal. A conclusão desta negociação, que durou mais de quatro anos e terminou com a promessa de ressarcimento à estatal de R$ 34,6 bilhões com recursos do certame, viabilizou o megaleilão.

— O modelo de partilha ficou com a culpa do fracasso do leilão, mas, que ele é ruim, todos sabemos. Deveria se colocar de forma mais transparente que o objetivo era buscar o ajuste fiscal no curto prazo. Foi um blefe estratégico. Desde o início, o governo sabia que teria dificuldades de ter agentes econômicos envolvidos nos leilões — afirmou Dutra.

Para Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o governo intensificou o calendário de leilões para resolver a questão fiscal:

— A 6ª Rodada não deu certo por três motivos: houve overdose de leilão. Não tem como fazer três leilões acavalados. Isso estressa as empresas. Foi feito na ânsia de resolver o problema fiscal. E calibrou mal os bônus, muito altos.

Pires acrescenta que o fato de o governo ter afirmado no dia do megaleilão que poderia rever o modelo de exploração também interferiu.

— Você não pode fazer isso na véspera de um leilão de partilha. Se a regra vai mudar, as petroleiras não vão entrar. Vão esperar a nova regra — disse o especialista, que, mesmo assim, classifica o resultado do megaleilão como um sucesso por concluir a venda de áreas em um modelo complexo.

Edmar Almeida, do Instituto de Economia da UFRJ, também atribui o resultado dos leilões à grande oferta de áreas em um único ano:

— As empresas que já estão no Brasil estão comprometidas com uma agenda de investimentos muito importante. Para elas, fica muito desafiador retirar uma quantidade tão grande de recursos do caixa neste momento. O momento econômico falou mais alto. A prioridade número zero da equipe econômica é a questão fiscal.

Almeida pondera que a discussão sobre a divisão dos recursos do pré-sal deixou clara a preocupação fiscal. O governo prometeu compartilhar mais recursos do petróleo com governadores e prefeitos, o que, de fato, fará com a arrecadação do megaleilão. Estados e municípios vão receber R$ 5,3 bilhões dos valores arrecados. O Rio receberá R$ 1 bilhão por abrigar as áreas leiloadas.

— Assistimos a um grande debate político sobre o que fazer com o dinheiro. Toda a discussão ocorreu como se não houvesse risco para a efetiva arrecadação.  O sucesso dos leilões nos últimos anos empolgou as autoridades. Certamente, não  esperavam este resultado. Mas o importante agora não é entender como aconteceu o fracasso, mas como tornar os próximos leilões um sucesso.

Após o resultado, o governo deve centrar esforços na mudança do regime de exploração no Congresso. A estratégia para levar a discussão adiante no Congresso é acelerar o andamento do projeto do senador José Serra (PSDB-SP) para aprová-lo na Câmara e no Senado no próximo ano e conseguir aplicar as mudanças em leilões de 2020. Segundo fontes, a avaliação é que o resultado fraco dos leilões criou ambiente favorável a mudanças na regulação. O projeto de Serra está sob análise da Comissão de Infraestrutura do Senado. Ainda haverá ao menos duas audiências públicas, no próximo dia 12, antes do projeto ser votado e seguir para duas comissões.

(Fonte: CBIE)