Investimento em infraestrutura exige respeito aos contratos, como mostra caso do Rio Grande do Sul

Causa perplexidade que processos simples de revisão tarifária de concessões à iniciativa privada saiam dos ritos normais
Sempre digo que é uma falácia achar que existe falta de recursos para investimentos em infraestrutura no Brasil. O que existe é a falta de um ambiente jurídico e regulatório atrativo que desperte real interesse do mercado. E esse fator é crucial para o futuro das unidades da federação no Brasil.
É o caso do Rio Grande do Sul. Às vésperas de completar um ano de sua maior tragédia climática, o Estado ainda vive o desafio da melhoria de infraestrutura.
Na energia elétrica, a queda de linhas de transmissão durante as chuvas de 2024 evidenciou a necessidade de diversificar o sistema e reforçar a segurança do abastecimento. Não fosse a termelétrica em Canoas, cujo combustível é o gás natural, parte do Estado teria ficado às escuras.
Na logística, o atual secretário da Casa Civil disse recentemente que, se a futura concessão de sete rodovias não for feita agora, o Estado terá graves problemas de escoamento da produção pelos próximos anos.
Às vésperas de completar um ano de sua maior tragédia climática, o Rio Grande do Sul ainda vive o desafio da melhoria de infraestrutura Foto: Wilton Junior/Estadão
Diante desse quadro, parece que no Estado investimentos em infraestrutura não acontecem em contextos de imprevisibilidade regulatória. Isso porque o volume inicial de recursos é significativo e os retornos são de longo prazo.
Por isso, causa perplexidade que processos simples de revisão tarifária de concessões à iniciativa privada saiam dos ritos normais, gerando dúvidas sobre o compromisso do Estado com a segurança jurídica.
Em 2021, o Rio Grande do Sul foi pioneiro na abertura do mercado de gás, concedendo a Sulgás à iniciativa privada, movido pelo desejo de mais investimentos e pela urgência de ampliar a arrecadação com leilões para equilibrar as contas públicas.
As premissas, à época, foram claras: manutenção do contrato de concessão vigente, com todas as cláusulas, para maximizar o valor da companhia, aumentando o valor recebido pelo Estado pela privatização. Quem participou do leilão certamente acreditou nas regras estipuladas pelo Estado, mas agora a realidade é outra.
Sob o verniz da evolução regulatória, a agência reguladora estadual alterou, unilateralmente, na revisão tarifária de 2024, a aplicação do contrato de concessão e, pelo terceiro ano consecutivo, apresentou “nova interpretação” de cláusulas do contrato, prejudicando quem confiou na segurança regulatória do governo gaúcho.
Fica a pergunta: como investir num ambiente de tamanha desconfiança institucional?
As sucessivas alterações metodológicas a cada rito ordinário representam um intervencionismo injustificado e criam um cenário sombrio de insegurança jurídica para os 19 anos restantes do contrato de concessão.
Se o Rio Grande do Sul quer continuar atraindo investimento privado para o setor de infraestrutura, é essencial que garanta o que está firmado nos contratos das concessões privatizadas. Sem isso, o Estado só vai conseguir atrair investidores aventureiros em processos licitatórios futuros.