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OPINIÃO

Durante o período de 10 de janeiro a 10 de fevereiro de 2019, o boletim FGV Energia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) ouviu 14 especialistas em energia nuclear de diferentes instituições, com o objetivo de coletar informações a respeito de diversos assuntos relacionados à utilização da energia nuclear no Brasil, entre eles: os benefícios e desafios associados à ampliação desta fonte para o sistema elétrico nacional; considerações necessárias para a implantação de novas usinas; a competitividade em termos de preço de venda da energia em relação às outras fontes; e as oportunidades e desafios relacionados à exploração de urânio no país. Confira a entrevista do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires.

Veja a opinião de Adriano Pires sobre a energia nuclear no Brasil para a FGV Energia. (Fonte: Revista Voto) Veja a opinião de Adriano Pires sobre a energia nuclear para a FGV Energia. (Fonte: Revista Voto)

ADRIANO PIRES

Diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE)

A ampliação da participação da energia nuclear na matriz elétrica, além de ser um bom negócio, é importante para o país como um todo. Atualmente, a energia nuclear representa cerca de 3% da geração de energia elétrica brasileira, portanto a maior inserção da energia nuclear será favorável à segurança do fornecimento de energia, pois trata-se de uma energia firme e que, portanto, garante provimento contínuo de eletricidade. Além disso, a energia nuclear é uma fonte barata, ou seja, de baixo custo de produção – apesar do elevado custo de investimento, amortizado ao longo do tempo-, contribui para o desenvolvimento sustentável, dado que não gera gases do efeito estufa na geração, e a construção da usina é um evento gerador de empregos.

Adicionalmente, são diversos os benefícios da ampliação da geração por fonte nuclear para o sistema elétrico, sendo o principal o aumento da confiabilidade e segurança no fornecimento de energia elétrica. O Sistema Elétrico Brasileiro passa por uma evidente transição energética, dada a perda da capacidade de regularização dos reservatórios das usinas hidroelétricas e a forte expansão das fontes renováveis intermitentes e sazonais como eólica, biomassa e solar. A redução da capacidade de armazenamento dos principais reservatórios do país vem tornando necessária a manutenção do acionamento térmico, por vezes sem planejamento adequado. Além disso, as novas hidrelétricas, em grande parte a fio d’agua, estão sendo construídas cada vez mais distantes dos centros de consumo, exigindo assim a construção de longas linhas de transmissão.

Por isso, o futuro do setor elétrico exige um balanço entre as fontes distantes, sazonais e intermitentes com fontes de geração constantes e próximas aos centros consumidores, garantindo, assim, a segurança no sistema. É nesse contexto que a reinserção das usinas nucleares no planejamento energético do país torna-se oportuna. Esse tipo de geração possui características benéficas ao sistema elétrico nacional, como: a possibilidade de implantação em áreas reduzidas, o elevado fator de capacidade, a grande oferta de energia na base, as grandes reservas de urânio existentes no país, o baixo custo do combustível, o domínio tecnológico do ciclo de enriquecimento do urânio e o reduzido impacto ambiental.

Para a implantação de uma nova usina nuclear, é de extrema importância o adequado planejamento e projeto, englobando custos, prazos e segurança. Merece destaque a questão da segurança, por ser esta uma das maiores preocupações relacionadas à geração por esta fonte. Deve-se ter impecável política de segurança, sobretudo relacionada ao armazenamento de resíduos radioativos e à segurança dos reatores, para prevenir acidentes. O projeto deve prever, também, a minimização dos impactos ambientais durante a operação das usinas, dada a geração de efluentes líquidos e gasosos, químicos e radioativos, originários de diferentes atividades, como manutenções, descontaminações, desativação de circuitos e mudanças na potência do reator. Esses efluentes são coletados, estocados e tratados, quando possível, para serem posteriormente descartados no ambiente, obedecendo os limites impostos pela legislação.

A vantagem do uso do urânio como fonte de energia é a sua alta concentração energética. Um quilo de urânio natural ou vinte cinco gramas de urânio enriquecido, que correspondem a vinte toneladas de carvão ou dez toneladas de petróleo, produzem 50.000 kWh (INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO, 2012). Uma das vantagens da exploração do urânio no país é a existência de expressiva reserva do mineral no nosso território. O Brasil ocupa a sétima posição no ranking mundial, com 309 mil toneladas do minério distribuídas entre Bahia, Ceará, Paraná e Minas Gerais. No Brasil, a maior utilização do urânio se dá na geração de energia elétrica, com utilização em menor proporção na medicina e agricultura. Para atender as usinas nucleares nacionais (Angra I e II), o país importa urânio, devido ao fechamento da mina de Caetité (BA) e, consequentemente, da queda na produção de urânio a partir de 2014. Assim sendo, mesmo com a queda da cotação internacional do urânio desde 2010, a retomada da exploração, produção e enriquecimento de urânio no país geraria economia com a importação (da ordem de centenas de milhares de reais) e garantiria maior segurança no suprimento. Ou seja, o fomento da exploração e produção de urânio no país, desde que viável economicamente, é importante tanto para o atendimento da demanda interna quanto para a exportação.

A ampliação da exploração e produção de urânio no país, contudo, exigirá o fomento à pesquisa e tecnologia. De igual importância é a viabilização de parcerias do setor privado com a Indústrias Nucleares do Brasil (INB), estatal de economia mista vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME) e encarregada da prospecção, pesquisa e lavra de jazidas de minérios nucleares. Segundo a World Nuclear Association, o Brasil possui cerca de 5% da reserva global de urânio, mesmo sem grandes investimentos em exploração desde a década de 90. No segmento de enriquecimento, os valores acumulados de investimento estão na faixa de R$ 500 milhões e a previsão é de que esse montante pode ser elevado em R$ 3 bilhões.

 (Fonte: FGV Energia)