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Revisão da Portaria ANP n.º 251/2000 pode levar a desequilíbrio da cadeia de suprimento de combustíveis

 

Em 12/11/2020, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou audiência pública sobre a proposta de revisão da Portaria ANP n.º 251/2000, que trata da regulamentação do acesso por terceiros aos terminais aquaviários para movimentação de petróleo e combustíveis. O processo de revisão dessa portaria começou em 2015.

De acordo com a agência, a necessidade do amplo debate se dá com a finalidade de compatibilizar os incentivos em investimentos portuários e o desenvolvimento de um mercado competitivo no setor de combustíveis a partir do amplo acesso de terceiros a instalações portuárias, o que estimularia a entrada de novos atores no mercado concorrencial. A conclusão, porém, confunde mercados de concorrência com mercados de monopólio natural. Aliás, essa confusão entre esses dois conceitos tem aparecido em diferentes propostas da ANP, em particular no setor do gás natural.

A consulta e audiência pública ANP n.º 1/2020 prevê a alteração dos pilares do modelo até então adotado para acesso não discriminatório por terceiros aos terminais aquaviários, existentes ou a serem construídos, questionando, inclusive, o direito do proprietário da instalação de movimentar suas cargas. A redação atual do texto propõe a subtração da preferência do titular de direitos de terminais localizados em portos organizados, desconsiderando os significativos investimentos realizados. Além disso, há a restrição da preferência do proprietário a portos não organizados a 50% da capacidade total, limitando os contratos de movimentação a no máximo dois anos. Outra importante restrição que a agência pretende implementar é não estender o direito à preferência do proprietário a pessoas jurídicas coligadas, subsidiárias ou pertencentes ao grupo econômico do operador.

Essa iniciativa da ANP vai de encontro aos princípios norteadores da política até então vigente, pondo em xeque o interesse de investidores na expansão e construção das infraestruturas, que não veem nessa medida a necessária segurança para realizar seus investimentos. Isso porque a única contrapartida existente – qual seja, a preferência na movimentação de seus produtos – está sob ameaça.

Cabe ressaltar, ainda, que a cadeia de suprimentos de petróleo e derivados no Brasil foi estruturada, ao longo de décadas, a partir de investimentos em instalações logísticas projetadas com uma visão de atendimento ao suprimento de petróleo e escoamento da produção das refinarias. Assim, há no Brasil um número de sistemas de escoamento de refino compostos por refinarias, dutos curtos, dutos longos, terminais terrestres e terminais aquaviários que é operado de forma interdependente e integrada. As instalações de movimentação e armazenagem pertencentes ao sistema de refino citado são fundamentais para o pleno funcionamento das refinarias e foram projetadas, no que diz respeito a sua capacidade, recursos e funcionalidades, para operar a partir de uma visão sistêmica, ou seja, para movimentação de volumes e produtos demandados pelos sistemas de refino.

Assim, se persistir a aprovação de modelo de acesso por terceiros com as características propostas, é esperado um desequilíbrio na cadeia de suprimentos de combustíveis do Brasil, o que pode até comprometer o atendimento ao mercado brasileiro.

Portanto, a possibilidade de dar acesso a terceiros a instalações privadas construídas por agentes da indústria de terminais de líquidos de maneira não discriminatória com arbítrio centralizado na ANP versus cenário de acesso negociado de terceiros de maneira bilateral entre as partes interessadas não nos parece uma medida regulatória de desincentivo a investimentos. As regulamentações da ANP devem ter o cuidado de não criar distorções no mercado concorrencial e na lógica de amortização de investimentos enterrados por agentes da indústria operando em mercado competitivo, sob o risco de regulamentar em resolução comportamentos oportunistas e deletérios para um ambiente saudável de competição de agentes, que, ao não imobilizarem capital fixo na construção de capacidade de tancagem em terminais próprios ou de terceiros, possam praticar preços predatórios conquistando parcelas de mercado de maneira indevida.

 

Fonte: Estadão